O Globo – Sérgio Fadul (1/3/2004)

O processo de sindicância aberto pela Caixa Econômica Federal para analisar os contratos com a Gtech Brasil constatou que a operação desde sua origem, em 1997, está recheada de irregularidades que resultaram em prejuízos milionários para a instituição. O relatório da investigação, iniciada em 2003, mostra que em diferentes momentos funcionários e ex-administradores da Caixa fizeram vista grossa para regras descumpridas, compactuaram com reajustes de preços desfavoráveis e quebraram regras operacionais da instituição. Pelo menos dez funcionários da CEF foram indicados pela sindicância como suspeitos de conivência com a Gtech.
Os funcionários foram divididos em dois grupos: os passíveis de acusação por crime de responsabilidade civil por descumprimento de normas internas da empresa e os suspeitos de terem cometido improbidade administrativa. A maioria das irregularidades encontradas envolve funcionários do primeiro grupo, sujeitos a sanções disciplinares como advertência ou suspensão. No segundo grupo, estão os suspeitos de terem cometido irregularidades mais graves e fazem parte dele ex-dirigentes da instituição. Nestes casos, os acusados estão sujeitos até mesmo a pena de prisão.
A sindicância da Caixa descobriu uma série de sinais de tolerância com a Gtech. Por mais de uma vez, afirma o relatório da sindicância, houve descumprimento do contrato sem aplicação, no prazo, de multa contratual. Um dos exemplos citados pela sindicância foi o fato de a Gtech ter deixado de instalar equipamentos a que havia se comprometido no contrato sem que a Caixa exigisse um abatimento na remuneração da empresa na proporção da redução de seus custos.

Ministério Público também investiga

Os funcionários que ainda trabalham na CEF estão sendo convocados pela sindicância para que tomem conhecimento de todo o processo. Em seguida, será concedido prazo de dez dias para que apresentem sua defesa. Na etapa seguinte, o processo será encaminhado a um comitê disciplinar que avaliará a participação de cada um desses funcionários e recomendará as punições. Uma cópia do relatório da sindicância já foi enviada ao Ministério Público Federal. E, assim que for concluído, todo o processo será novamente encaminhado ao Ministério Público e também ao Tribunal de Contas da União para que aprofundem as investigações.
Desde 1997, todo o sistema de loterias federais administrado pela Caixa é operado pela Gtech, uma multinacional americana que faz desde a interligação de todas as casas lotéricas à Caixa até o processamento dos dados. As relações da Caixa com a Gtech têm chamado a atenção pelo conflito de interesses e voltaram a ficar em xeque após o escândalo envolvendo o ex-assessor do Palácio do Planalto Waldomiro Diniz, que se reuniu com diretores da empresa antes da última renovação do contrato.
As administrações passadas da CEF também são acusadas de omissão por não terem cobrado da Gtech a transferência de tecnologia e do banco de dados para a instituição, conforme previa o contrato. Ao mesmo tempo, concordaram com a repactuação de preços em prejuízo da Caixa. De 1997 a 2000, as tarifas cobradas nas contas de concessionárias públicas passaram de R$ 0,05 para R$ 0,15, uma variação de 200% em apenas três anos.
Ontem, a Gtech Brasil publicou nota de esclarecimento nos jornais na qual afirma que seus preços “atendem aos parâmetros normais de serviços lotéricos e os reajustes decorreram da variação de custos operacionais e aumento de escopo de serviços”. A Gtech também afirma na nota que o processo de transferência de inteligência está sendo feito, desde outubro de 2003, seguindo rigorosamente os termos do acordo feito com a CEF.

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