Na Campanha Nacional dos Bancários, devido à falta de consenso entre os bancos membros da Federação Nacional dos Bancos (Fenaban), a Convenção Coletiva de Trabalho da categoria não trouxe cláusulas específicas sobre teletrabalho, deixando o debate sobre o assunto para ser definido banco a banco. Na última semana de setembro, a Comissão Executiva dos Empregados (CEE), que representa os trabalhadores da Caixa na mesa de negociação, enviou ofício à direção do banco cobrando uma mesa para tratar do tema teletrabalho. Outros bancos, como o Bradesco, já avançaram na discussão e apresentaram propostas de aditivo.

O teletrabalho tem sido aplicado durante a pandemia para reduzir os riscos de contágio dos trabalhadores e da população pela Covid-19. O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, disse que a empresa pretende ampliar o programa de trabalho remoto para depois da pandemia. O modelo, porém, é problemático e precisa mudar.

A assessoria jurídica da Apcef/SP analisou o RH 226, vigente até 31 de dezembro, que criou, à luz da reforma trabalhista, os “novos modelos de trabalho” chamados “Trabalho Remoto” e “Mobilidade Caixa”. Confira um resumo das considerações da advogada Gislândia Ferreira:

Trabalho Remoto – A normativa, editada em 3 de junho de 2019, instituiu o modelo de trabalho à distância, o qual pode ser realizado pelo empregado em sua própria residência, em espaços colaborativos, em outras unidades Caixa e até em outro país. O modelo assemelha-se e traz regramentos do “teletrabalho” dispostos nos artigos 75 “A”, ”B” e “C” da CLT, introduzido pela Lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista).

A normativa prevê a alteração de regime de trabalho (de presencial para remoto) por meio de aditivo contratual (RH 226 – 3.1.1.5), nos moldes em que está regulamentado o teletrabalho pelo artigo 75 C e §1º da CLT.

A normativa trazia, em seus anexos, três tipos de aditivos ao contrato de trabalho, cada um correspondente ao modelo de trabalho instituído: Projeto Remoto Nacional, Projeto Remoto Internacional e Projeto Remoto, sendo este último de curto prazo, limitado ao máximo de 30 dias por semestre.

Importante ressaltar que a RH 226 condiciona a participação do empregado no modelo de Trabalho Remoto ao seu desempenho no GDP, dando a falsa impressão de reconhecimento e valorização do trabalhador.

Na versão 004 do normativo, vigente a partir de 9 de abril de 2020, foi introduzido um quarto tipo de aditivo ao contrato de trabalho, denominado Projeto Remoto Excepcional. Este novo aditivo prevê a possibilidade, a critério do gestor, do trabalho remoto ser prorrogado por prazo superior a 30 dias e em condições especificas, a depender da situação.

Nesta modalidade de trabalho, remoto/teletrabalho, o empregado é excluído do controle de jornada, permitindo assim que realize acima de 6 horas diárias de e 30 horas semanais (ou 8 horas diárias e 40 horas semanais no caso de cargos gerenciais) sem o devido pagamento da prorrogação de jornada.

A norma, ao dispor que o empregado exerça de forma autônoma as suas atividades dá a falsa ideia de liberdade de ação, mas contraditoriamente estabelece que se trata de um novo contrato por produção. Há flagrante ofensa ao artigo 7º XVI, que estabelece a proteção ao labor de jornadas a 8 horas diárias e 44 horas semanais.

Importante ressaltar também a questão da saúde do trabalhador, visto que estará exposto aos riscos de acidentes do trabalho inerentes à atividade desenvolvida, sem (em tese) qualquer responsabilidade do empregador (item 3.2.1.3). Esta situação ficou evidente com a pandemia, com a exigência aos empregados, que estão trabalhando em suas casas, do cumprimento das mesmas metas antes estabelecidas no trabalho nas dependências da empresa. Desconsidera-se a falta de estrutura, física e material, para a prestação dos serviços, além da sobrecarga mental.

Mobilidade Caixa – A RH 226 também cria a modalidade de trabalho “móvel”, distinguindo-o do teletrabalho ou trabalho remoto. Neste modelo, o empregado, por iniciativa própria e concordância da chefia, realiza suas atividades em diferentes unidades da Caixa, diversa da sua unidade de lotação, ou de forma externa (fora da empresa), e/ou, ainda em equipe virtual.

Nesta modalidade, o empregado atua de forma “volante”, desempenhando suas atividades onde for necessário e a critério da empresa. Traz os mesmos vícios e precarizações do modelo do Trabalho Remoto. Além disso, esta modalidade traz a agravante de que “Não será de competência da Caixa o pagamento de ajuda de custo, passagem, hospedagem ou qualquer custo adicional para a realização da atividade em município diverso da lotação administrativa.”.

Concluindo: a RH 226, com exceção de poucos pontos, está alinhada ao disposto na CLT, particularmente os artigos 62, III e 75 A a 75E, consolidando-se como um instrumento de gestão legal. Todavia, como mencionado, há clara ofensa a direitos legais e constitucionais dos empregados, evidenciados com o trabalho remoto/teletrabalho exercido pelos empregados durante a pandemia.

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