A deputada Érika Kokay (PT-DF) iniciou sua militância no movimento estudantil ainda na ditadura, em 1976 e foi uma das pessoas expulsas em 1977 por liderar a greve histórica na Universidade de Brasília (UnB) naquele ano (posteriormente reintegrada). Em 1982 ingressou na Caixa. Fazia horário noturno para conciliar com o estudo, quando, indicada pelos colegas, começou a militar no movimento pela sindicalização e pela jornada de seis horas, ou seja, para que o empregado da Caixa fosse considerado bancário. Agora, nesta entrevista, ela conta do orgulho que tem de ter participado dessa luta e realça a importância da Fenae na luta pela manutenção do papel social da Caixa que é de todos os brasileiros.

Fenae –  Como a senhora avalia a importância da Fenae e da organização das Apcefs que levou ao reconhecimento do empregado Caixa como bancário e aprovação da carga horária de seis horas por dia?

Érika – Nós lutávamos pelo direito à sindicalização e para sermos reconhecidos como bancários, e as associações foram fundamentais. Eu fui a vários lugares no Brasil nessa época e vi como as Apcefs se colocaram à disposição da nossa luta, tão prioritária, para que pudéssemos escrever nossa própria história. Nós esperávamos o mês de janeiro para saber quanto o nosso salário tinha sido reajustado, não erámos sindicalizados e nem bancários e tínhamos a jornada de oito horas. Você até podia fazer seis horas, mas eu um único horário e com redução de 30% no salário. E, depois não poderia voltar a fazer oito horas. Conquistamos as seis horas com o apoio da Fenae e das Apcefs. O primeiro Conecef só pôde se realizar com a atuação da própria Fenae. No começo da luta, era na Fenae que a gente se reunia e discutia para apontar os rumos desse movimento e termos a primeira conquista, o direito à sindicalização.

Fenae – A deputada também foi líder estudantil na UnB, em plena ditadura. Conte um pouco sobre essa história, incluindo o período em que esteve na direção da Fenae, como foi crescer politicamente junto com a democratização do país e a organização dos empregados da Caixa?

Érika – Eu comecei minha vida política em 76, quando entrei na UnB, em 77 participei da greve histórica, pela qual fui expulsa e reintegrada só mais tarde. Entrei na Caixa em 82 fazendo seis horas à noite para conciliar com a universidade. Lembro de estar na compensação e de receber as visitas das companheiras falando sobre a luta das seis horas e que após a reunião os colegas, em sua maioria também estudantes da UnB que já conheciam minha militância, meio que me elegeram para representá-los nesse movimento. Era ainda uma estranheza muito grande, falar de greve pela primeira vez numa instituição centenária como a Caixa. Mas foi um momento de grande unidade, de muita solidariedade e beleza. Estávamos saindo de uma ditadura, das salas escuras da tortura e dos silêncios, queríamos muito ter voz. O movimento dos bancários da Caixa cresceu com a retomada democrática e, por isso, ele tem muita qualidade e deve ser muito respeitado. Uma solidariedade como a que tivemos com os 110 companheiros demitidos no governo Collor, dos quais bancamos os salários por um ano de nossos companheiros, até que fossem reintegrados. E a Fenae sempre esteve presente nesses momentos de construção da luta.

Fenae – Qual a importância da atuação da Fenae em conjunto com os movimentos populares e sociais para que a Caixa cumpra sua função social e pela sua manutenção como empresa 100% pública?

Érika – Eu penso que a Fenae é um diferencial nessa luta, com suas características e atuação. Foi fundamental, por exemplo, na luta pela centralização do FGTS em 90, a luta para que a empresa não fosse usada pela tropa de choque do impeachment de Collor, contra a investida de privatizar e fundir os bancos públicos tentada por FHC. A Fenae representa tudo isso a partir de um movimento dos empregados e também tem tradição em projetos sociais de combate à fome e de construção da cidadania.

Em especial, a mobilização e a luta em defesa da Caixa é exemplar e defender a Caixa é defender a maior articuladora de políticas públicas do país. É a Fenae quem está denunciando para a opinião pública o banco digital*, o IPO da Caixa Seguridade, enfim, é a entidade que está encampando essa luta junto com os sindicatos.

Fenae – Neste momento tão difícil no Brasil, onde somos reféns de um governo que está entregando nossas riquezas, como continuar a lutar, mobilizar e integrar os empregados nessa grande tarefa de defender a democracia? Em que a Fenae e os empregados da Caixa podem contribuir neste momento?

Erika – A Fenae sempre esteve em todas as lutas em defesa da democracia, mas nós estamos vivenciando agora o governo da necropolítica (conceito criado em 2003 pelo filósofo camaronês Achille Mbembe, que descreve como, nas sociedades capitalistas, o Estado define quem deve viver e quem deve morrer), que considera natural que haja fome e morte, e ao mesmo tempo a entrega do país ao capital rentista que está dominando no Brasil e não gera emprego e não precisa de desenvolvimento da economia. Eu duvido que o Bradesco entregue sua plataforma digital, como pretende o presidente da Caixa, ou sua seguridade à sanha do mercado em um momento de crise. Temos que resistir como sempre resistimos, e a saída ainda é a organização dos trabalhadores e da sociedade. O Brasil precisa respirar, o Brasil não respira com Bolsonaro, que está submetendo o Estado brasileiro a uma lógica imperial, a serviço dos seus projetos pessoais e dos seus amigos. Mas a Fenae, os empregados da Caixa e os brasileiros resistirão!

Fenae – Alguma mensagem aos empregados da Caixa nos 50 anos da Fenae, por terem construído uma entidade deste porte?

Érika 
– Estou no quinto mandato parlamentar e estou há 18 anos fora da Caixa, mas não deixei a Caixa, a carrego comigo, porque tenho muito orgulho dessa empresa tão importante para o Brasil. Seus empregados nos enchem de alegria e tenho orgulho de ter feito parte do processo de construção desse movimento de trabalhadores. A Fenae também é partícipe dessa história e está de parabéns por representar tão bem os anseios dos empregados da Caixa. Já sofremos muitos ataques, mas como sempre estaremos juntos para resistir, porque quem tem compromisso com o povo brasileiro fortalece a Caixa.

*Banco digital – Com o nome de banco digital, a direção da Caixa está criando uma outra instituição financeira, responsável pelo pagamento de todos os benefícios sociais operados pela Caixa. A passos largos, o governo federal e a direção da Caixa preparam a venda do banco digital. A Fenae vem alertando a população para o perigo da privatização do banco digital, que pode causar prejuízos à sustentabilidade da Caixa, um banco tão essencial para desenvolvimento do país.

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