Dirigentes de várias entidades, como a Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (Anabb), Federação Única dos Petroleiros (FUP) e Sindicato dos Bancários do Distrito Federal criticaram, durante live realizada no último sábado (19), a privatização das estatais. Eles defenderam a necessidade de a população brasileira apoiar as mobilizações em defesa destas companhias e mostraram detalhes de ações que já estão sendo vistas em várias empresas como investidas para abrir caminho para estas vendas.

Conforme deixaram claro, as privatizações “atentam contra a soberania nacional e contra missões estratégicas destas estatais para o desenvolvimento do país”. Os participantes da live lembraram, ainda, a importância do Projeto de Lei (PL) 4.269/2020, em tramitação na Câmara, que criminaliza qualquer tentativa de venda destas companhias sem autorização do Legislativo. O encontro virtual foi promovido pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF), uma das autoras do projeto.

O presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sergio Takemoto, destacou a importância de as entidades vinculadas à defesa das estatais e a sociedade civil como um todo permanecerem “em alerta” e não abaixarem a guarda em relação às tentativas de privatização destas empresas.“Desde 2019 a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) e a Fenae já estavam preocupadas com esse processo”, lembrou ele.

Segundo Takemoto, o Supremo Tribunal Federal (STF) se manifestou proibindo a privatização das chamadas “empresas mãe” sem o aval do Congresso e liberando a venda das subsidiárias sem esse tipo de autorização legislativa. Diante dessa decisão, o governo tenta agora se aproveitando dessa brecha para conseguir privatizar a Caixa Econômica Federal e outras empresas.

“Estão tentando enganar o povo, o Supremo e o Congresso Nacional, além de excluir a população desse debate, para que os brasileiros não percebam que está havendo a privatização de empresas como Caixa, Banco do Brasil, Petrobras e Correios”, afirmou o dirigente da Fenae.

Sergio Takemoto também destacou que todas as pesquisas têm indicado que a população é contra a privatização das estatais. “O presidente diz que no governo dele não haverá privatização, mas na prática fala isso para tirar a atenção da população e tentar criar condições para privatizar as subsidiárias. Mesmo se o STF for favorável a nós, não poderemos baixar a guarda, pois o governo vai fazer de tudo para entregar o que prometeu ao mercado financeiro”, afirmou.

Takemoto contou que já está sendo observado um enfraquecimento do papel da Caixa, que vem perdendo mercado no financiamento para micro e pequenas empresas e para os financiamentos habitacionais. Além disso, o fundo de garantia tem sido esvaziado, assim como programas como o “Minha Casa, Minha Vida”.

“São segmentos em que a Caixa sempre teve uma predominância de atuação e que mostram a relevância do banco na questão social. Infelizmente, esse governo não tem preocupação com o papel social da Caixa e muito menos com a população mais carente desse país”, reclamou.

Ele denunciou ainda que cinco dias após a publicação da Medida Provisória (MP) 995 – que abre brechas para a privatização de subsidiárias da Caixa – o presidente do banco foi ao mercado comunicar que tinha a intenção de abrir o capital da Caixa Seguros e mostrou que pretende vender a administradora de cartão, gestão de ativos e o banco digital da Caixa.

“A Caixa Seguros representa cerca de 20% do lucro da estatal”, comentou Takemoto. “Mas nós estamos reagindo. Entramos com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF questionando a MP, fizemos um manifesto que contou com o apoio de mais de 200 entidades e apresentamos mais de 400 emendas ao texto da MP no Congresso. Vamos fazer, nesta quarta-feira (23) uma grande mobilização com a sociedade e lançaremos a campanha ‘Mexeu com a Caixa, mexeu com o Brasil’”, contou.

Aguardando o TCU

De forma semelhante pensa o presidente da Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (Anabb), Reinaldo Fujimoto. Segunda ele, a entidade já realiza uma segunda fase da campanha intitulada “Não mexe com o meu BB”, que tem o objetivo de proteger o banco diuturnamente contra esse processo de privatização.

Recentemente o governo anunciou no Banco do Brasil a venda de uma carteira de quase R$ 3 bilhões que foi vendida para o BTG por R$ 370 milhões. “Logo que ouvimos esse comunicado da venda, por 10% do valor de mercado, questionamos o conselho de administração do banco e enviamos carta ao Tribunal de Contas da União (TCU), ao Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM)” contou.

O presidente da Anabb explicou que como eles receberam uma resposta da presidência do banco que não foi satisfatória, foram atrás de outras avaliações e ouviram de CEOs que a venda foi uma vergonha, realizada sem licitação nem prévio conhecimento ao mercado. “Em cima disso, fizemos uma segunda denúncia e estamos aguardando avaliação do TCU sobre essa venda”, disse.

Representante da Federação Única dos Petroleiros (FUP), o diretor Mário Alberto Dal Zot, também do Sindpetro do Paraná e de Santa Catarina, foi outro a externar na live a situação, diante da corrente privatista do atual governo. Zot contou que até sexta-feira (25) será julgada pelo STF uma reclamação feita ao tribunal pelas mesas diretoras do Senado e da Câmara dos Deputados contra o Executivo contra a tentativa do governo de ampliar as privatizações.

O argumento apresentado pelas duas Casas legislativas é de que o Executivo tenta fatiar as “empresas mãe” para burlar a decisão daquela Corte (de que só a privatização das empresas mãe deveria passar pelo crivo do Legislativo, mas as subsidiárias poderiam ser vendidas sem essa autorização). “Com isso, tenta-se transformar parte dessas estatais em subsidiárias para colocá-las a venda”. 

Indutor do desenvolvimento

“A Petrobras já vem fazendo isso com algumas subsidiárias, mas aproveitou esse gancho para poder transformar algumas unidades em subsidiárias e anunciou a venda de oito refinarias. A Petrobras está deixando de ser a empresa para a qual foi criada, para atender à distribuição em todo o país. O que estão vendendo não é a refinaria em si, é o mercado que essa refinaria representa”, denunciou ele.

O dirigente da FUP disse, ainda, que “estão concentrando a Petrobras e tudo o que ela representa para o Brasil apenas aos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo. Estão deixando de pensar no futuro, enquanto empresa, e na soberania nacional também”, afirmou.

“Temos que fazer a sociedade entender porque existe a Petrobras, porque a companhia se transformou nesse motor indutor do desenvolvimento brasileiro. Vender uma empresa dessas vai contra inclusive, seus acionistas. A sequência de tudo isso traz muito prejuízo para os estados e cidades onde a Petrobras atua”, afirmou.

Ele lembrou que o movimento está se mobilizando para o próximo dia 3 de outubro, data de aniversário da Petrobras, contra a privatização da estatal, assim como contra a venda da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e dos bancos estatais.

Márcio Dal Zot destacou o Projeto de Lei (PL) 2.715/2020 apresentado pelo deputado Enio Verri (PT-PR) que proíbe a venda de empresas públicas até 12 meses após a pandemia. “É de extrema relevância neste momento pelo qual estamos passando”, acentuou.

‘Não andamos só’

Já Kleitton Moraes, presidente do sindicato dos bancários no Distrito Federal, aproveitou a live para dar uma injeção de ânimo e estímulo às mobilizações que estão em curso.

“Não andamos sós. Estamos de mãos atadas e unidas com essas entidades na defesa intransigente do interesse dos representados. Temos conseguido conciliar a pauta legítima, corporativista, com a pauta das grandes discussões e temas nacionais e sinto-me muito seguro de caminhar e mãos dadas com os companheiros”, destacou.

Moraes disse ainda que Banco do Brasil e Caixa são “expressões da identidade territorial e de compreensão cultural do país”. “São entidades que nos ajudam a nos afirmarmos enquanto povo, enquanto nação. Entidades que cumprem esse processo de desenvolvimento de integração, de ajudar a promover o desenvolvimento nacional”, acrescentou.

“Além da importância da missão que cumprem, não apenas os dois bancos, como as outras estatais, são empresas que dão retorno estratégico para o país”, completou.

PL 4.269/2020

A deputada federal Erika Kokay (PT-DF), organizadora da live, é autora do Projeto de Lei (PL) 4.269/2020, que tipifica como crime a privatização de qualquer estatal sem autorização do Legislativo.

O texto, apresentado por ela conjuntamente com o também deputado federal, Frei Anastácio Ribeiro (PT-PB), acrescenta um artigo à Lei  13.303/16, referente ao estatuto jurídico da empresa pública, para estabelecer que constitui crime contra o patrimônio público realizar atos com o objetivo de desestatizar sem autorização legislativa, parcial ou totalmente, empresa pública ou sociedade de economia mista, inclusive por meio de alienação de ativos transferidos para subsidiárias com este objetivo.

Na justificativa ao PL, os deputados citam as recentes propostas de venda de ativos de bancos federais e alertam sobre as irregularidades da Medida Provisória 995, editada no último dia 7 de agosto para abrir caminho à privatização da Caixa.

“Essa discussão é extremamente relevante para o patrimônio público brasileiro. Estamos discutindo aqui as manobras que esse governo tem feito para privatizar nossas estatais. Estamos vendo, inclusive, uma terceirização das ações do Governo para o parlamento com declarações do presidente de que veta uma lei, mas pede para o Congresso rejeitar o veto. Ações desse tipo mostram que não temos hoje um presidente da República sério”, acusou a deputada. “Estamos todos lutando pela soberania nacional”, acrescentou ela.

Segundo a parlamentar, diante de irregularidades constatadas na preparação para venda de ativos de subsidiárias da Caixa (Caixa Seguridade, Caixa Cartões e Caixa Loterias), foram feitas várias representações ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Tribunal de Contas da União (TCU).

“Pedimos a apuração do que acreditamos ser a total falta de transparência e de autorização legal para a gestão dessas alienações”, ressaltou a deputada. A live foi realizada no último sábado (19).

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